Bruno Souza dos Santos, 17 anos, tinha medo de ir para casa sozinho. Segundo uma vizinha que lhe fazia companhia vez ou outra, o jovem temia morrer no caminho.

Na noite de quarta-feira, ele não estava sozinho. Acabou sendo morto a tiros por dois homens, na frente de cerca de 15 pessoas que tinham acabado de participar de um culto evangélico na Rua dos Pescadores, Boca do Rio.

De acordo com uma das líderes do culto, Bruno chegou quase no final. Era a primeira vez que ele participava da reunião do Ministério Apostólico Ágape. Sua avó e sua irmã estavam no encontro.

Amigos e parentes durante enterro do adolescente, na Quinta dos Lázaros. Jovemtemia ser morto e pediu que evangélicos orassem por ele

“Estávamos na rua, quando Bruno parou para o culto. Ele não era convertido, mas pediu uma oração pela vida dele, que estava precisando”, contou a missionária, que preferiu não se identificar.

Atingido nas costas, no peito e na cabeça, o adolescente chegou a ser socorrido para o Posto de Saúde de Marback, mas já chegou na unidade sem sinais vitais.

No atentado, Joelma Melo da Silva, 39, foi baleada no braço esquerdo. Ela foi encaminhada ao Hospital Geral do Estado (HGE), mas já recebeu alta. No entanto, a bala ainda está alojada e ela deve passar por um cirurgia em breve para a retirada do projétil.

De acordo com parentes do jovem assassinado, ele teve envolvimento com o tráfico de drogas, mas estava afastado do mundo do crime e se tornara evangélico. O adolescente já tinha um filho de 1 ano e sua namorada está grávida.

Crime

Assim que o grupo do Ministério Ágape terminou sua reunião, dois homens chegaram por trás já atirando contra a vítima. “Foi uma correria muito grande. A irmã Joelma recebeu uma bala perdida. A avó dele (Bruno) desmaiou na hora e nós tivemos que amparar”, contou a líder do culto.

De acordo com informações registradas no posto policial do HGE, os dois autores dos disparos estavam encostados em um muro, acompanhando à distância o estudo bíblico. Ao fim da reunião, eles se aproximaram de Bruno e atiraram.

Entretanto, a missionária que coordenava o estudo afirma não ter notado a presença dos suspeitos antes que eles chegassem e fizessem os disparos. Segundo ela, outros participantes também não suspeitaram da dupla. “Só vi o rosto de um. Ele parecia bem apessoado. Um vizinho viu os dois e disse que não dava para desconfiar de nada”, afirmou.

A missionária disse ainda que, no grupo, que contava com a irmã e avó do jovem, todos sabiam do envolvimento dele com o crime. “Sabíamos que ele se envolvia com coisas erradas, mas não sei o que”.

Outra mulher que faz parte do Ministério Ágape reiterou que ninguém estranhou a aproximação dos atiradores. “Todo mundo achou que estavam ouvindo nossas palavras, mas estavam à espera de Bruno”, comentou.

Eduardo Santos, também membro do Ministério, não estava no culto, mas afirmou conhecer Bruno do bairro. “Apesar de ele não ser crente, tentei ajudá-lo espiritualmente. Dava muitos conselhos. Mas isso foi rixa de facção. Já tinham tentado matá-lo antes, há uns dois meses. Os caras apareceram em um carro atrás dele, mas ele conseguiu fugir”, contou.

Enterro

Pedindo sigilo de identidade, um tio do adolescente confirmou que ele já tinha sofrido uma tentativa de assassinato. “Já tentaram, mas ele conseguiu correr”, limitou-se a dizer, durante o enterro do corpo da vítima, realizado no Cemitério Quinta dos Lázaros, na Baixa de Quintas, no final da tarde de ontem.

Na cerimônia, em que muitas pessoas chegaram a desmaiar e precisaram ser amparadas por parentes, uma tia do rapaz disse que a morte foi surpreendente para a família, pois Bruno já não teria nenhuma relação com o tráfico “há muito tempo”. “A gente acredita que foi raiva mesmo porque ele deixou essas coisas”, opinou.

Também no enterro, outra familiar disse que Bruno estava com medo ultimamente, mas não soube afirmar se ele tinha recebido ameaças.

Por sua vez, um primo da vítima que se identificou apenas como Anderson, tem certeza que Bruno não era o alvo dos assassinos. “Era um menino normal. Mas como vivemos em um bairro periférico, isso acabou acontecendo”.

Na ocorrência registrada na 9ª Delegacia, na Boca do Rio, aparece o nome ou apelido de cinco homens que teriam algum envolvimento com o crime. Eles estão identificados como DVD, Troncho, Herbert, Li e Angolano. No enterro, nenhum familiar ou vizinho de Bruno confirmou a relação dele com algum destes.

O crime está sendo investigado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), em um inquérito conduzido pelo delegado Reinaldo Mangabeira. Procurado pelo CORREIO, o delegado não atendeu às ligações para comentar o caso.

Salvador é cidade com mais mortes por arma de fogo

Salvador foi a capital brasileira que registrou mais mortes por arma de fogo em 2010, o ano mais recente que tem os dados disponíveis no Mapa da Violência 2013, elaborado pelo Instituto Sangari (vinculado ao Ministério da Justiça) e divulgado na noite de quarta-feira.

Com 1.596 mortes por armas de fogo, a capital baiana ficou à frente, em números absolutos, de cidades como Rio de Janeiro (1.486) e São Paulo (1.172). O estudo leva em consideração dados referentes ao período de 2000 a 2010.

Na evolução do período, as mortes em Salvador saltaram de 619 no primeiro ano para 1.596 (2010), o que representa um aumento de 157,8%. Já a taxa de mortes por arma de fogo a cada 100 mil habitantes saltou de 25,3 em 2000 para 59,6 em 2010, um aumento de 135,4%.

Na comparação entre os estados, a Bahia subiu da 15ª posição no ano 2000 – com uma taxa de 11,7 mortes, para passar a ocupar a 4ª colocação, com uma taxa de 34,4 no último ano avaliado. Em 2010, a Bahia só teve menos mortes por arma de fogo que os estados de Alagoas (55,3), Espírito Santo (39,4) e Pará (34,6).

A Bahia computou 1.523 mortes em 2000, total que chegou a 4.818 em 2010, registrando um aumento de 216,3%. O Mapa da Violência 2013 apresenta ainda um ranking de municípios de todo o país com mais de 20 mil habitantes, feito com base numa média de mortes entre os anos 2008, 2009 e 2010.

A Bahia tem sete cidades entre as 20 primeiras. São elas: Simões Filho (1º), Lauro de Freitas (3º), Porto Seguro (6º), Eunápolis (8º), Itabuna (12º), Jacobina (14º) e Dias D'Ávila (19º). Salvador aparece na 30ª posição do ranking.

Questionado sobre os dados na manhã de ontem, em solenidade da Polícia Militar, o secretário de Segurança Pública, Maurício Barbosa, disse que não podia comentar em detalhes porque ainda não tinha visto o estudo. “Todo ano lança o mapa. São critérios que vão variando. Não estou discutindo critérios. Está latente o esforço que estamos fazendo para melhorar a segurança pública com a aquisição de armamentos, viaturas. São coisas que geram efeito de longo e médio prazo. Estamos sofrendo consequências dos últimos dez anos”, disse. “Esses estudos tem que ser encarados com vários fatores. Nós fornecemos dados com mais transparência por isso somos piores avaliados. Não sei qual o critério, metodologia que usaram. Todos os locais críticos estão com bases comunitárias”, completou Barbosa. Fonte: Correio