Aos 4 anos, ele já sabia o que queria. Quando os pais se separaram, ele optou em morar com o pai, motorista de ônibus aposentado. O menino queria ficar longe da mãe, funcionária de um mercadinho, porque ela era rígida na educação. O garoto é o xodó do rodoviário, que o ensinou a dirigir com apenas 8 anos. Como o pai costumava viajar, o menino vivia à vontade na localidade do Alto do Cruzeiro, em Cosme de Farias. Aos 13, foi recrutado para ser o motorista de uma quadrilha de traficantes e assaltantes de carros.

No último domingo, agora com 14 anos, comandou o assalto que acabou com a morte da professora Andrea Borges Astolpho. Ele foi apreendido na terça-feira. Quarta, a Justiça decidiu pela internação dele e do outro rapaz, de 16 anos, que também participou do crime, na Comunidade de Acolhimento Sócio-Educativo (Case), em Tancredo Neves. Eles podem ficar até três anos internados.

A promotora de Justiça no Atendimento ao Autor de Atos Infracionais, Marli Barreto, disse que interrogou o menino por uma hora e meia. “A frieza dele salta aos olhos, além da gravidade dos relatos e o grande números de episódios infracionais. Ele relata sem revelar arrependimento. De manhã, ele deu esta entrevista, acompanhado da delegada titular da Delegacia do Adolescente Infrator (DAI), Claudenice Mayo, que definiu o garoto como “extremamente calculista”.

Depois da entrevista, ele perguntou à delegada se, ao sair, as pessoas teriam acesso à sua ficha criminal. A delegada explicou que não, porque o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina que o adolescente não pode ter antecedentes criminais. “Ah, bom!”, relaxou.

Como você entrou na criminalidade?

Comecei fumando maconha lá no Alto do Cruzeiro. Só em época de festa (sorri). Queria andar com os caras do Alto do Cruzeiro e ficava na cola deles. Queria entrar no grupo, mas ninguém dava nada por mim. Um dia, disse a eles que sabia pilotar muito bem, mas ninguém levava fé. Aí, quando me viram pegando o carro de meu pai, começaram a me recrutar. Daí fui pilotando, pilotando…

Você dirigiu até Jiquiriçá para vender um carro que havia roubado? Não teve medo da polícia?

Sim. Fui à noite, que é mais difícil a polícia abordar. (Ao chegar na cidade, acabou apreendido pela polícia após denúncia de um parente)

A fama de piloto lhe rendeu prestígio no grupo? A polícia disse que você roubou mais de 20 carros.

Deus é mais! Aparece coisa que nem existe. Não, não era algo constante. Pegava um aqui, outro ali. Nada de 8, nem 10, nem 20, como já disseram por aí. Só peguei 6.

Qual era a sua relação com o traficante Titanic, que era líder do tráfico de Cosme de Farias e foi morto pela polícia em fevereiro deste ano?Muito pouca. Só levei um carro que ele pediu para Jiquiriçá. Era para entregar a um cara, mas não deu.

Você planeja suas ações?

Outro dia eu estava de bobeira em casa e pensei um plano para matar um caguete, mas desisti. Ele é barril.

Que plano? Contra quem?

Gilson. Ele é de Cajazeiras. Quando aparece lá (Cosme de Farias) mata todo mundo. A minha ideia era pegar ele no Largo dos Paranhos. Atravessar o carro dele e o parceiro fazer o resto. Isso porque só faço pilotar.

Já matou alguém?

Nunca! Só peguei em uma arma uma vez, e foi um revólver para tomar uma moto na Avenida Bonocô. (Segundo a Polícia Civil, na greve da PM deste ano, o garoto usou uma arma para render os funcionários da Insinuante da Boca do Rio e fugiu com mercadorias em um carro que tinha acabado de roubar).

Realmente partiu de você o comando para assaltar a professora de matemática?

Não atirei em ninguém. Eu apenas apontei o carro. Ela estava com o carro parado, com o motor funcionando. Mas era só para pegar (o carro). Era de bom tamanho. O carro dela nem era para fazer dinheiro. Era para usar em outro assalto.

Qual foi a sua reação ao saber que a educadora morreu no assalto?

Ô, né! Era só o carro…

Você se considera perigoso?

Perigoso? Eu? Não! Perigo nenhum. Nem fui perigoso até agora. Não tenho coragem de apertar (um gatilho).

Sua infância foi sofrida?

Não, pelo contrário. Brinquei muito, principalmente no interior (em Jiquiriçá), com meu pai e meus primos. Corria bastante.

E sua mãe?

Meus pais não deram certo e fui morar com o meu pai. Minha mãe era muito rígida. Preferi ficar ficar com ele. Meu pai conversava muito comigo, abria meus olhos, dizia para eu largar essa vida porque e os caras poderiam me apagar. Sou o xodó dele. (O pai do garoto está internado em Vitória da Conquista, depois de passar por uma cirurgia no coração. Ao falar dele, o garoto fica com olhos marejados)

Você estudou até que série?

Até a 6ª. Mas quando fico em casa, de bobeira, jogo Playstation ou vou bater o baba na quadra.

Você acredita que poderá mudar?

Sim, com fé em Deus. Não vou me misturar lá (na Case). Vou ser um homem de Deus. Meu sonho é ser cantor de pagode ou jogador de futebol. Gosto do Igor Kannário. Com informações do Correio.