Durante audiência Pública realizada pelo Ministério Público Federal na Bahia, na última quarta-feira (23), com o objetivo de debater a permanência da comunidade quilombola Rio dos Macacos em área da União, sob o comando da Marinha, em Simões Filho, ficou determinado o agendamento de reunião entre comunidade, MPF e União, visando elaborar contraproposta ao Governo, prevendo a delimitação e estruturação do território quilombola.

No encontro, foram discutidas a situação territorial da comunidade e as dificuldades enfrentadas pelos moradores em função de uma decisão judicial que atribui à Marinha a propriedade das terras ocupadas pelos quilombolas.

A audiência contou com a presença de cerca de 60 membros da comunidade. Os moradores apresentaram, em diversos depoimentos, a situação em que vivem, sem contar com as condições mínimas de saneamento básico, saúde e educação, e relataram casos de violência e abuso de autoridade por parte da Marinha. Para tentar solucionar a questão, o diretor da Secretaria Nacional de Articulação Social da Secretaria Geral da Presidência da República, Fernando Matos, discutiu com a comunidade uma proposta de delimitação do território quilombola que já havia sido apresentada pelo Governo em dezembro do ano passado. “Esse é um momento de diálogo, de abertura, de escuta. Nossa tarefa é apresentar aos senhores uma proposta que foi formalmente apresentada no final do ano passado para tentar resolver o problema da comunidade”, disse.

A proposta do Governo prevê a mudança da comunidade do local onde está atualmente instalada para um espaço de cerca de 29 hectares, com casas para 67 famílias, água encanada, saneamento básico, energia elétrica, posto de saúde, área de preservação ambiental e área de cultivo. A proposta foi rejeitada pela comunidade, que se apoia em relatórios antropológicos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da prefeitura de Simões Filho, que reconhecem como necessários para os quilombolas cerca de 301 hectares de terra. Com a recusa da comunidade, o representante do Governo sugeriu a elaboração de uma contraproposta, para que esta possa ser discutida e avaliada.

Contraproposta – Tendo em vista a deficiência técnica dos moradores da comunidade para a elaboração de uma contraproposta – destacada pelo secretário estadual de Promoção da Igualdade Racial, Elias de Oliveira Sampaio – o chefe do gabinete do ministro da Defesa, Antônio Thomaz Lessa, assumiu o compromisso, junto com o Procurador Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), Leandro Bastos Nunes, a debater a proposta apresentada pelo Governo e intermediar a elaboração da contraproposta, por meio de uma reunião que será agendada com a comunidade Rio dos Macacos, na próxima semana.

O PRDC reiterou, ainda, que o estabelecimento de um acordo é a forma mais célere de resolver o conflito, ressaltando que a alternativa de buscar o reconhecimento do território por via judicial poderia se estender por muitos anos, causando ainda mais transtornos aos quilombolas. “Peço que reflitam sobre a validade de um acordo benéfico, benéfico para a comunidade, que possa acelerar a solução da questão”, afirmou. Além disso, ele garantiu que caso seja firmado um acordo judicial, buscará prioridade no julgamento do processo.

Histórico – Existente há mais de 200 anos, a comunidade quilombola Rio dos Macacos enfrenta um conflito com a Marinha do Brasil há cerca de 42 anos, quando o local onde a comunidade está instalada foi escolhido para a construção da Base Naval de Aratu. Desde então, os integrantes da comunidade, que hoje conta com mais de 300 pessoas, alegam ser alvo de ações violentas, praticadas por oficiais da Marinha, na intenção de expulsar cerca de 46 famílias residentes no local.

O conflito ganhou ainda mais força após a decisão da Justiça Federal na Bahia, que determinou a desocupação de área situada na Base Naval de Aratu pela comunidade quilombola. Em maio deste ano, o MPF ajuizou agravo de instrumento perante o Tribunal Regional Federal da Primeira Região, contra a decisão.

Em 2011, o MPF já havia proposto ação civil pública pedindo que a Justiça determinasse a permanência da comunidade no local, mas os pedidos não foram acatados. Em junho de 2012 o órgão expediu uma recomendação ao Comando do 2º Distrito Naval da Marinha do Brasil, visando a coibição de prática de atos de constrangimento físico e moral contra os quilombolas.