No futebol, é comum ouvir histórias de jovens atletas que mudaram de vida após subir para o elenco profissional. Promessas que mal saíram da adolescência, conquistaram fama e mudaram drasticamente de sorte. Histórias em que a pobreza ficou para trás, encoberta por carros de luxo e casas caras. A trajetória do volante Feijão tinha tudo para ser assim em 2013. Só que o jogador do Bahia decidiu fazer diferente.

Apesar de ter uma casa alugada em um bairro nobre de Salvador, Feijão decidiu abandonar o luxo e passar as férias na casa onde cresceu, na comunidade do Brasilgás, área pobre de Salvador. A simplicidade segue inalterada. Descalço, de bermuda e camiseta, o jogador recebeu a equipe do GloboEsporte.com na tarde da última terça-feira como se esperasse um grupo de amigos e relembrou o ano mágico que viveu.

Promovido no início do ano, logo após marcar um gol decisivo contra o Corinthians na Copa São Paulo, competição em que o Bahia chegou às semifinais, Feijão falou abertamente sobre a carreira, que ainda está nos primeiros passos. Com um sorriso aberto, o volante conta que a recepção no elenco profissional foi à base de 'pancadas', uma grande brincadeira para um garoto que já cresceu, mas não deixou de ser uma grande criança.

– A recepção foi boa. Mas no vestiário eu levei um monte de pancada (risos) – conta o jogador.

De jovem promessa, Feijão se tornou protagonista de uma marca importante com a camisa do Bahia. Contra o Internacional, na Arena Fonte Nova, o atleta marcou o gol mil do Tricolor em edições de Campeonato Brasileiro. O feito foi bastante comemorado pelo volante, que, acostumado a destruir jogadas adversárias, não imaginava que poderia ser o autor de um dos tentos mais importantes da história recente do clube baiano.

– Venho de uma família humilde e entrei para a história do Bahia pelo gol mil. Foi uma coisa que não tem preço que pague – diz com orgulho.

As polêmicas também marcaram presença no ano do jogador. Antes do Ba-Vi válido pelo segundo turno do Campeonato Brasileiro, Feijão disse que odiava o Vitória. A declaração rendeu um puxão de orelhas no jogador, que, desde então, não apareceu mais para as entrevistas coletivas no Fazendão. O volante, contudo, não se arrepende do que disse sobre o Rubro-Negro.

– A polêmica foi por falta de maturidade. Não pensei direito e veio tudo aquilo. Mas não me arrependo de nada que eu disse. Se voltasse no tempo, falaria tudo de novo – afirma.

Torcedor assumido do Bahia, Feijão pode deixar a equipe baiana no fim deste ano. Tricolor e Flamengo encaminham uma troca: o atacante Rafinha e o meia Gabriel seriam emprestados ao time baiano, que cederia o volante para o Rubro-Negro carioca até o final de 2014. Ainda respirando os bons ares de 2013, Feijão diz que não se importa muito com a negociação: garante que vai ser feliz de qualquer forma.

– Vou ficar feliz se ficar no Bahia. Mas também vou ficar feliz se for para o Flamengo – assegura o volante.

Simples na essência, Feijão leva a vida sem grandes preocupações. No fundo, ele sabe que o futebol muda a vida de muita gente. Que pode trazer fortuna e sucesso. Mas ele não liga. Prefere a rotina que o fez ser Feijão, menino da comunidade do Brasilgás e candidato a ídolo do Bahia. Confira na íntegra a entrevista com o jogador tricolor.

GloboEsporte.com: Como você avalia o ano de 2013?

Feijão: O ano de 2013 foi muito bom. Quando o diretor da base me disse que eu ia subir para o profissional, fiquei muito alegre. Todo jogador das categorias de base sonha em um dia fazer parte do elenco principal do time em que joga. Subir é o sonho de todo jogador da base. Estava esperando esse momento e aconteceu. Daqui para frente, é só alegrias.

Tudo começou contra o Corinthians, na Copa São Paulo. Você imaginava que podia fazer sucesso em tão pouco tempo?

Fiz o gol contra o Corinthians na segunda fase da Copa São Paulo deste ano. O nosso time era muito bom. Tinha do outro lado o Corinthians com a torcida apoiando. O estádio estava lotado. Mas Deus me abençoou, e consegui fazer o gol que garantiu a nossa classificação. O que aconteceu neste ano foi tudo muito rápido. Esperava que tudo isso acontecesse aos poucos. Deus esteve ao meu lado, minha família também. Daqui para frente, quero crescer mais e mais, ganhar títulos e entrar para a história do clube.

Você foi promovido logo após a Copa São Paulo por Jorginho. Como foi a recepção do elenco profissional?

A recepção foi boa. Mas, no vestiário, eu levei um monte de pancada (risos). Pior recepção possível. Me deram um trote. Mas foi uma boa recepção com o grupo.

De início, você era apenas uma aposta. Mas não demorou muito para conquistar a titularidade. A velocidade com que as coisas aconteceram te assustou?

Não esperava ser titular de uma hora para outra. Mas com trabalho, dedicação, focado nos treinos, fui abençoado por Deus. Consegui jogar algumas partidas como titular. Não sou titular absoluto e espero jogar mais em 2014, virar titular absoluto e conquistar títulos.

Você não é titular absoluto, mas marcou o gol mil do Bahia em Brasileirões, feito importante para a história recente do clube. O que passou por sua cabeça no momento do gol?

Foi o gol contra o Internacional, segundo turno do Brasileirão. Estávamos atravessando uma sequência ruim. Gol importante. Não acreditava que seria eu o autor do gol mil. Só minha mãe dizia que eu ia marcar (risos). No momento em que saiu o gol, passaram muitas coisas pela minha cabeça. Venho de uma família humilde e entrei para a história do Bahia pelo gol mil. Foi uma coisa que não tem preço que pague. Graças a Deus, consegui isso. Sou baiano, torcedor do Bahia, e fico muito feliz por ter meu nome na história do clube.

Você vem de uma família humilde e, mesmo com o sucesso recente, não mudou de hábitos. Essa é a essência do Feijão?

É sim. Eu estava longe da minha comunidade. Falei para minha mãe e vim passar uns dias aqui. Passo o tempo resenhando, brincando com meus amigos de infância. Tudo de boa. Gosto da minha comunidade.

Antes do Ba-Vi válido pelo segundo turno do Brasileirão, você deu uma declaração polêmica. Disse que odiava o Vitória. Se arrepende de ter dito aquilo?

Foi meu segundo Ba-Vi como profissional. A polêmica foi por falta de maturidade. Não pensei direito, e veio tudo aquilo. Mas não me arrependo de nada que eu disse. Se voltasse no tempo, falaria tudo de novo. Para mim, não tem essa. Jogar contra o maior rival é uma coisa que parece que é o pior inimigo da face da terra está em sua frente. Aprendi desde menino a odiar o Vitória. Espero ganhar o Baiano em cima deles e a Copa do Nordeste também. Tudo com trabalho, humildade, pés no chão.

Descontar as goleadas sofridas no Baiano também?

Devolver sim. Estava no banco, sofrendo. Espero que o Bahia nunca mais passe por isso. Espero que, daqui para frente, a gente ganhe os Ba-Vis e conquiste títulos.

Você renovou contrato com o Bahia até 2018. O processo de negociação foi tranquilo?

Foi natural. A diretoria sentou com meu empresário, acertou as negociações. Todos saíram felizes. Sou jogador do Bahia até 2018.

Além do sucesso nos campos, você se tornou garoto-propaganda do Bahia fora das quatro linhas. É mais difícil ser modelo do que jogador?

É muito difícil (risos). Nunca mais na vida quero passar por isso. É muito chato. Ruim demais. Se pudesse ficar no Bahia fazendo qualquer outra coisa, é melhor. Toda hora pediam para repetir. E eu já cansado (risos). Não estou acostumado. Mas futebol é isso, né?

Sobre a negociação com o Flamengo, já chegou algo até você?

Está tudo com os meus empresários e os diretores do Bahia. Só soube até agora das coisas que falam na televisão. Espero que tudo se resolva o mais rápido possível. Mas meu pensamento é no Bahia. Tenho contrato com o Bahia. Me reapresento em janeiro com o restante do elenco. Não penso no Flamengo agora, não.

Você é assumidamente torcedor do Bahia. Não se sentiria estranho jogando de vermelho e preto?

Nada. O Flamengo é um time de grande expressão. Reconhecido mundo afora. Campeão mundial, campeão da Libertadores, campeão brasileiro. Para mim, jogar em um time rubro-negro seria normal. O Flamengo é uma vitrine para todos os jogadores que querem mostrar o potencial para o mundo, que querem chegar na Europa. Não teria problema algum.

E se a transação com o Flamengo se confirmar, já tem algum plano?

Se tiver mesmo, vou levar minha família comigo. Mas tem que ver meus irmãos, que estão estudando. Só isso mesmo.

Sobre o futuro, no Bahia ou no Flamengo, quais são as expectativas?

Espero um 2014 melhor que 2013. Muito sucesso. Vou ficar feliz se ficar no Bahia. Mas também vou ficar feliz se for para o Flamengo. A expectativa é por um 2014 muito bom.

*G1.