Quem passa sem aviso pela Avenida Simon Bolívar, no Jardim Armação, nem nota. Mas ali, perto da saída para a orla, atrás do campo de barro e acobertado pelo matagal, está o caminho usado por Roberval Bispo de Souza, o Piloto, para escapar da polícia após participar do assalto que resultou na morte da servidora da Ufba Selma Alves.

Junto com o comparsa Raimundo Portela Filho, Piloto já está preso. No entanto, logo depois do crime, despistou os policiais juntando-se aos ratos na vala que, sob o asfalto, cruza toda a orla e desemboca na praia do Jardim de Alah, ao lado do Aeroclube.

Foto: Correio

A manobra usada por Piloto é comum. Sem forçar a memória, policiais indicam outras galerias subterrâneas de Salvador usadas por bandidos em fuga. Os pontos mais lembrados estão no Rio Vermelho, Amaralina e Pituba, todos com saída na praia, para onde deveria escoar apenas água da chuva.

Acaso

Enquanto algumas rotas são conhecidas, para o tenente da Polícia Militar Marcelo Tonete, da Operação Gêmeos, cujos colegas perseguiram Piloto até a água da vala bater nos joelhos, o bandido entrou ali por acaso.

“Eu mesmo não conhecia essa rota. De carro não dá pra ver. Eles bateram o carro na fuga e saíram correndo. Acredito que ele (Piloto) entrou no mato pra se esconder, viu a vala e aproveitou”, disse Tonete.

Esta é a mesma opinião do major Jarbas, comandante da 39ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM), responsável pela área de Armação. “Naquela região do canal, não há grande incidência criminal. Por isso, não temos registro desta rota de fuga”.

Um homem que trabalha perto da galeria tem outra visão. “Direto os marginais passam por aí. Se roubarem aqui na rua, já correm aí pelo esgoto”, afirma ele, pedindo sigilo de identidade.

Amaralina Tal divergência não ocorre quando se trata da galeria que liga o Nordeste de Amaralina à praia, com saída na altura do Posto Shell da Avenida Amaralina.

“Fazemos o monitoramento dessa rota. Ficou conhecida na ocupação policial (do Nordeste)”, diz o comandante da 40ª CIPM, major Marcelo Barbosa. “Eles (os ladrões) ficam no passeio ou na areia. Se alguém der bobeira, o cara rouba e já entra ali. É normal”, conta um vendedor informal da região.

Foto: Correio.

Seu relato foi confirmado em menos de dois minutos. Enquanto conversava com o CORREIO, o mesmo vendedor alertou: “Ali, rapaz!”. Nesse momento, um jovem salta da calçada e, com um saco na mão, se mete na galeria, que tem cerca de 1,2 metro de altura.

Para circular ali, é preciso ficar o tempo todo acocorado. A fétida passagem é tomada por pedaços de plástico, garrafas pet e resíduos orgânicos, tudo arrastado pela água da chuva. “Só gente ruim pra ficar aí dentro tanto tempo”, opinou um banhista. Passados 25 minutos, o jovem não havia retornado.

Perto dali, um estudante que mora no Nordeste de Amaralina e pratica exercícios diariamente na praia diz já ter perdido a conta das vezes em que avistou ladrões ou usuários de drogas utilizando a galeria como esconderijo.

Ele se referia à saída próxima ao Largo das Baianas. “Isso aqui era sempre. Os caras entram aí mesmo. Só deu uma melhorada nos últimos tempos depois que botaram a viatura aí”, disse o jovem, apontando para a equipe da PM na calçada.

Mão dupla

Na praia da Pituba, há pelo menos quatro caminhos de saída para a chuva e de entrada para os marginais: em frente ao Posto BR, à Perini e duas próximas à Colônia de Pescadores. “Todo mundo aqui sabe disso. A polícia sabe que eles se entocam aí e não adianta nada”, reclamou um pescador.

“Nós sabemos que os bandidos usam esses caminhos de fuga. Fazemos ronda e estamos sempre atentos, mas não posso deixar um policial 24 horas na entrada do esgoto”, argumenta o major Luís Paraíso, comandante da 13ª CIPM, afirmando ainda que as galerias da Pituba são mais utilizadas como saída de suspeitos que fogem da polícia no Nordeste.

Já o major André Ricardo, comandante da 12ª CIPM (Rio Vermelho/Ondina), acha que a rede subterrânea da sua área é utilizada com mais frequência no sentido inverso – levando ao Nordeste.

“Não temos muitos registros de roubos e fuga por ali (Praia do Buracão). Serve mais de escapatória quando nós realizamos operações de combate ao tráfico de drogas na praia”, diz o oficial, apontando a galeria que vai dar na Rua do Eco, no Nordeste de Amaralina.

Questionado sobre as ações realizadas pela polícia para evitar esse tipo de fuga por pontos já mapeados, o comandante geral da PM, coronel Alfredo Castro, disse que a corporação analisa a instalação de grades em algumas galerias, mas fez ponderações.

“Para isso, é preciso também um envolvimento da prefeitura e todos os segmentos da área de saneamento para termos solução. Uma grade solucionaria meu caso, de polícia, mas será que não daria entupimento? Temos que pensar numa medida conjunta, que vise dificultar a ação de marginais e traga a tranquilidade para levar os detritos e água pluvial para seu destino. Vamos tomar uma decisão em conjunto”, concluiu. As informações são do Correio.

Foto: Correio.