Os advogados Ary Bergher e Rafael Mattos, que defendem Thor Batista, consideraram descabida a condenação do empresário pela morte de um ciclista. Eles afirmam que irão recorrer da decisão da juíza Daniela Barbosa Assumpção de Souza, da 2ª Vara Criminal de Caxias, assim que o despacho for publicado em Diário Oficial.

A magistrada condenou Thor Batista pelo atropelamento e morte do ciclista Wanderson dos Santos. O filho do empresário Eike Batista terá que prestar dois anos de serviços comunitários, terá a carteira de habilitação suspensa pelo mesmo período e pagará uma multa de R$ 1 milhão. Thor foi condenado por homicídio culposo – sem intenção de matar.

– A juíza simplesmente chancelou a desigualdade. Ela o colocou numa posição superior apenas por ser rico. Ele só foi punido porque é rico. O artigo 5º da Constituição diz que todos são iguai perante a lei – criticou Ary Bergher, que diz ainda que a juíza não levou em conta os laudos periciais anexados ao processo, que garantem que Thor estaria entre entre 100 e 115 quilômetros por hora quando atropelou e matou um ciclista:

– O sistema penal brasileiro fala em livre convencimento por parte do juiz. Não há uma hierarquia entre as provas, mas neste caso, a juíza simplesmente aboliu as provas técnicas. Essa decisão é uma destrofia do Direito Processual Penal brasileiro.

Na sentença, publicada na tarde desta quarta-feira, a magistrada justifica que, com as provas técnicas, os depoimentos das testemunhas e o interrogatório do empresário, “obtém-se a certeza, necessária à condenação, de Thor, que no dia dos fatos criou riscos proibidos que ensejaram o acidente e a consequente morte da vítima.” Ainda de acordo com a magistrada, o empresário deverá cumprir a pena em uma entidade a ser indicada, preferencialmente desenvolvendo atividade “voltada para o auxílio na recuperação de vitimados no trânsito”.

Já a multa deverá ser convertida em gêneros de acordo com a necessidade da instituição a ser beneficiada, preferencialmente “de cunho hospitalar ou de reabilitação de pessoas acidentadas no trânsito”.
A juíza Daniela Barbosa alega que o valor tem caráter reparador e preventivo e considera “estapafúrdia” a alegação de Thor de que sua empresa – ele foi nomeado diretor estatutário da EBX – vem passando por problemas. A juíza afirma que Eike Batista "é um dos empresários mais ricos do mundo, com fortuna estimada em R$ 19,4 bilhões".

Na sentença a magistrada também lembra que, durante seu interrogatório, Thor respondeu que teria sido paga uma indenização de R$ 300 mil à família do ciclista. O valor do acordo, entretanto, foi de R$ 1 milhão. Para a magistrada, a confusão denota a "total indiferença e despreocupação em relação aos seus gastos pessoais."

O acordo financeiro entre as família, inclusive, foi questionado pela magistrada em sua sentença. Segundo ela, "não se entende por que motivos não teria questionado na esfera cível a culpa concorrente da vítima", diz o texto. Sobre o fato de a defesa pleitear que, com a indenização, ficou demonstrado o "arrependimento posterior de Thor", a sentença frisa que o juízo "não discute o eventual arrependimento do réu, em caráter puramente subjetivo". A explicação de Daniela é que, para tal, seriam necessários três quesitos: que a reparação do dano fosse integral, pessoal e voluntária. E, no caso, pelo menos dois deles não se encontram presentes.

Eike Batista será investigado

No documento, a juíza solicita ainda que se investigue uma eventual prática de crime por parte de Thor, de Eike Batista, de Maria Vicentina Pereira, Cristina Gonçalves – mãe de criação e companheira de Wanderson, respectivamente – e do bombeiro Márcio Tadeu Rosa da Silva, que recebeu R$ 100 mil no acordo.

"É função do bombeiro militar agir para salvar vidas, minorar danos, ser cordial e auxiliar no que for preciso, não tendo o mesmo praticado atos além daqueles que deveria praticar por dever de ofício", diz o texto.
Ela também determina que o Comando do Corpo de Bombeiros informe, em 48 horas, se Márcio estava a serviço da corporação no dia do acidente. Daniela ainda solicita a apuração de delitos relacionados ao perito de local e ao policial federal que testemunhou o fato.

Daniela Barbosa ainda destaca que "a conduta imprudente de trafegar em velocidade acima da permitida" para o trecho da BR-040 indica a responsabilidade de Thor. Na sentença, ela lembra a alegação da defesa de que o empresário"trafegava sem a imposição de riscos a terceiros" e dentro da velocidade permitida na via. Os advogados ainda argumentam que houve imprudência da vítima, "por estar embriagada e atravessar em local não permitido e pouco iluminado em sua bicicleta sem itens necessários de segurança."

Na sentença, a juíza atesta que Thor Batista dirigia a uma "altíssima velocidade", já que não conseguiu manobrar nem frear para evitar o impacto, uma vez que ele mesmo garantiu que viu a vítima e o perito de local constatou que ela poderia ser percebida a uma distância de 30 ou 40 metros – o que seria suficiente se estivesse em velocidade moderada.

O empresário contou que freou, mas a juíza analisa que o carro dele (um Mercedes McLaren) desacelera de 100 km/h a 0 em pouco mais de três segundos. O documento ainda avalia o corpo de Wanderson, que ficou "estraçalhado", conforme mostram o exame cadavérico e as fotos do processo. *O Globo