A jovem Tertuliana Lustosa é vocalista da banda de pagode “A Travestis”, compositora, bacharel em História da Arte, mestranda em Cultura e Sociedade e agora realiza seu maior sonho, tornando-se uma escritora publicada, aquele desejo que nasceu primeiro entre suas tantas vertentes artísticas.

Sempre com muito a dizer, a piauiense residente de Salvador já chega às livrarias com três obras. Estas são o romance “Playboi”, o livro de ensaios intitulado “Manifesto Traveco-terrorista” e o poético “Morte e Vida Sertransneja”, através dos quais divide suas vivências enquanto travesti do sertão de Corrente e propõe revolução.

Tertuliana conta que cansou de ver corpos dissidentes como o dela apenas sendo objeto de análise de pessoas cisgêneras (indivíduos que se identificam com o gênero atribuído ao nascer). Para a escritora, é chegado o momento de assumir protagonismo.

“A literatura precisa de travestis porque, infelizmente, a gente vive em um mundo onde quem conta as nossas histórias são sempre pessoas cisgêneras. Então a gente precisa contar as nossas histórias a partir das nossas perspectivas, do nosso olhar”, diz.

As obras

Antes de pensar em estudar arte ou montar uma banda de pagodão baiano, Tertuliana Lustosa já almejava uma carreira na literatura e foi assim que nasceram os primeiros rascunhos do romance “Playboi”, quando a autora tinha 12 anos de idade.

O livro, no entanto, foi alterado no decorrer dos anos para apresentar experiências de uma travesti em diferentes contextos sociais. “É como se a transição da personagem acompanhasse a minha transição”, a escritora comenta.

No livro de poemas “Morte e Vida Sertransneja” afloram as vivências da menina que cresceu em Corrente, foi ao Sudeste em busca de uma vida melhor e retornou ao Nordeste. “Aborda toda essa diáspora de você achar que o Sudeste é o local de salvação para a gente que é nordestino e do sertão. Aborda também o que perdemos nesse Sudeste”, Tertuliana explica.

Já a coletânea de ensaios na qual se destaca o “Manifesto Traveco-terrorista”, o leitor tem a oportunidade de conhecer textos produzidos por ela durante a graduação na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), apresentando possibilidades de reação às tantas estatísticas negativas que perseguem pessoas trans e travestis, como a baixa expectativa de vida provocada pela transfobia.

Ela não para por aqui

Foto: Reprodução/Instagram/Enzo Karin.

Na literatura, a artista conta se inspirar em autores como Conceição Evaristo, Clarice Lispector e José Saramago. Inclusive, foi de uma obra deste último, “O Homem Duplicado”, que tirou seu nome. Tertuliana dá seus primeiros passos neste cenário e o vê com otimismo, destacando que artistas que fogem ao padrão têm encontrado modos de se expressar mesmo neste sistema excludente.

No entanto, assume que ainda é necessário lutar por uma maior valorização e segue produzindo em várias frentes com este objetivo. “Eu canto pagodão, escrevo literatura de cordel, literatura popular e, ao mesmo tempo, verso no meu romance essa existência travesti da Aldeia Maracanã, da CasaNem. Estou agindo sobre diversas militâncias ao mesmo tempo”, conclui.

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