Parte da bancada evangélica de Feira de Santana, a 100 km de Salvador, protesta contra a inclusão de casais homossexuais no programa de casamento coletivo da cidade, que tem previsão para ser realizado em dezembro deste ano.
Segundo informações da Câmara Municipal, na manhã desta quarta-feira (25), o vereador Edvaldo Lima (PP) repetiu um protesto realizado na semana passada contra a inclusão dos casais no programa. Ele teria dito que, caso a cerimônia seja realizada, os evangélicos fariam caminhada pela família como forma de protesto.
De acordo com Fábio Ribeiro, presidente do Grupo Liberdade Igualdade e Cidadania Homossexual (GLICH), a pressão fez com que os gays propusessem cerimônia separada dos heterossexuais. "Por causa da pressão dos vereadores, inclusive porque são líderes, estão incentivando manifestações contra os casais gays. A gente conversou e achamos por bem separar os casais", justifica a decisão. Após as manifestações, os homossexuais recuaram e ainda não definiram a participação no programa, aponta.
O vereador Edvaldo Lima confirma ser contrário à inclusão dos gays na cerimônia. "Primeiro quero dizer que os evangélicos não são homofóbicos, nós não somos. Os evangélicos têm uma posição, que é de defender a familia, e eu, como evangélico, cristão, é esse o meu dever". Para o parlamentar, o artigo 226 da Constituição Federal lhe dá bases legais para discordar.
"Está bem explícito na Constituição que o Estado só reconhece como casamento a união entre homem e mulher. Recentemente houve uma resolução, um ato administrativo, mas só que a resolução não pode ser contrária a 513 deputados constituintes, que aprovaram a Constituição. Devemos respeitar e amar a nossa Constituição e, no livro de genêsis [na Bíblia]. Deus criou o macho e a fêmea. O livro que orienta sobre a nossa vida familiar", opina.
Fabio Ribeiro, que é assistente social, diz que casais gays desistiram da cerimônia coletiva devido ao conflito. "Alguns casais que estavam ligando, propondo, depois das manifestações contrárias, não se interessaram mais. A gente achava que não seriam muitos, mas tínhamos esperança que cerca de 10 casais participassem. O medo de constrangimento causou isso", explica.
Conforme lembra Ildes Ferreira, secretário de Desenvolvimento Social na cidade, a inclusão dos casais gays está de acordo com aresolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que obrigou os cartórios a realizarem casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
"O casamento coletivo acontece todo ano na cidade. Só que agora a novidade legal é que os casais homoafetivos também podem participar. Se a lei não discrimina ninguém quanto à diversidade sexual, nossa obrigação, como gestores, é a de incorporar, respeitar a lei", explica o secretário.
Segundo ele, em contrapartida à falta de casais gays, até esta quarta (25) tinham mais de 100 casais heteros inscritos. "Acredito que [a ausência de gays] não tenha sido por conta do protesto do parlamentar, não sei, mas vamos aguardar até o dia 25 de outubro, quando as inscrições serão finalizadas", diz Ferreira.
Presidente da Câmara Municipal e membro da bancada evangélica, Justiniano França (DEM) diz que, além da opinião da bancada, as questões levantadas vão de encontro com pleito de "alguns" casais heteros, que, segundo ele, se recusaram a participar do mutirão com casais homossexuais.
"A minha posição é que deve acontecer em dois momentos. Eu entendo que, enquanto Estado, há a obrigação de realizar porque a lei diz. Não devo entender que é uma discriminação, mas têm aqueles que querem participar de forma separada", diz.
Para o parlamentar, as pessoas que são contrárias à participação dos gays têm na religião as suas motivações. "Não aceitam por uma questão pessoal. Muito mais voltada na questão da religiosidade de cada um. Existe o entendimento que alguns não aceitam e a gente apoia essa questão", opina França.
O vereador Edvaldo Lima é mais enfático: "Nós, cristãos, estamos prontos para fazer caminhada, manifestação, assim como eles [gays] foram para a Câmara me desafiar e me ameaçar. O caminho não é por aí, é cada um buscar seu ponto e preencher seus vazios. Os nossos vazios preenchemos em Cristo e o dos 'homo' eu não sei aonde eles preenchem. Mas que fique com eles a vontade de buscar outro local e outro momento para casar, independente de estar 'forçando a barra' para fazer o casamento com a familia tradicional", relata.
Para Fábio Ferreira, presidente do GLICH, propor um casamento coletivo entre todos seria, mais que os incentivos nas taxas para casar, incentivar a ideia de integração. "É o primeiro ano e a gente tem esperança que, no decorrer dos anos, possa continuar integrando outras discussões à sociedade e, quem sabe, não aconteça no próximo ano? Que possamos não só dar o direito, mas que heteros e homos possam conviver no mesmo espaço, sem a ideia de que um é família e o outro não é", aponta. "A gente queria colocar todos cidadãos no mesmo patamar. Por que vamos dar igualdade, mas igualdade em momentos separados? Não há motivo para haver separação. E a ideia da convivência, da cerimônia conjunta, mostraria que a nossa sociedade daria uma resposta ao preconceito", afirma.
Apesar de ser contrário, como afirma, o vereador Edvaldo enfatiza que ama a todos. "Eu amo todos eles, tenho relacionamento com todos eles, sem problema ou preconceito, mas não podemos permitir isso e devemos ser respeitados em nossas crenças", alega.
Inscrições
A Secretaria de Igualdade de Feira de Santana informa que as datas e locais para os casamentos coletivos ainda serão definidas. As inscrições gratuitas podem ser feitas na Casa dos Conselhos, na rua Domingos Barbosa de Araújo, nº 160, no bairro Kalilândia. É necessários levar os principais documentos, como RG e CPF.
*G1.