De acordo com informações confirmadas nesta segunda-feira (26/10), pela ONG Justiça Global, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil pelas mortes e violações de direitos humanos recorrentes da explosão de uma fábrica clandestina na cidade de Santo Antônio de Jesus, na Bahia, no dia 11 de dezembro de 1998. Na ocasião, 64 pessoas foram a óbito.

A ONG ressaltou que a decisão foi proferida em julho deste ano, mais especificamente no dia 15, durante o 135º Período Ordinário de Sessões. Porém, só foi tornada pública na presente data, após considerar o cenário do ocorrido.

“As vítimas se encontravam em situação de pobreza estrutural e eram, em amplíssima maioria, mulheres e meninas afrodescendentes, quatro delas estavam grávidas e não dispunham de nenhuma alternativa econômica senão aceitar um trabalho perigoso em condições de exploração”, diz parte do documento disponibilizado pela ONG.

Ao longo do documento, também é destacado que a Corte considerou que o estado brasileiro tinha conhecimento de que eram realizadas atividades perigosas na fábrica e mesmo assim não inspecionava nem fiscalizava o local adequadamente.

O conteúdo da decisão frisa que o local “apresentava graves irregularidades e alto risco e perigo iminente para a vida, integridade pessoal e saúde de todos os trabalhadores. Além das irregularidades citadas, a fábrica era exploradora de trabalho infantil, o que violava os direitos ao trabalho e ao princípio da igualdade e não discriminação”.

A ONG ainda lembra que, dos 64 trabalhadores mortos na explosão, 63 eram mulheres. A única vítima do sexo masculino era uma criança, de 11 anos de idade. Dentre as vítimas havia também 22 crianças e adolescentes, com idades entre 11 e 17 anos. A maioria era negra.

O documento explicou que, dos 57 atestados de óbito juntados ao processo, 49 eram de pessoas negras, 3 brancas, e 6 sem identificação. Cabe salientar que quatro mulheres estavam grávidas e, dessa maneira, três bebês que ainda estavam no ventre também são vítimas da explosão.

Nos 20 anos da tragédia, parentes de vítimas e sobreviventes da explosão fizeram uma manifestação na cidade.

Explosão x Justiça

A explosão aconteceu por volta das 11h do dia 11 de dezembro de 1998.

Os homens ficavam em um local fabricando as bombas, enquanto as mulheres ficavam em uma área mais acima, amarrando os traques de pólvora.

Segundo dados das investigações da época, no momento da explosão, haviam cerca de 1,5 tonelada de pólvora no local.

Um ano depois, em 1999, o Ministério Público da Bahia entrou com medida cautelar visando bloquear os bens dos responsáveis pela fábrica clandestina.

Mais de dez anos depois, em 2013, foi fechado um acordo para pagamento de indenizações aos familiares das vítimas. Porém, o acordo foi descumprido.

Em 2016, um novo acordo foi feito, mas segundo a promotora Aline Coutrim, os valores só foram pagos parcialmente.

“A gente teve que executar esse acordo, então incidiu multa, cláusula penal, e o valor chegou a R$ 1,7 milhão. Depois que o MP entrou com a execução, foi feito um novo acordo do qual foram pagas algumas parcelas. Foram pagos três depósitos, foi levado um bem a leilão, e hoje a gente ainda tem R$ 476 mil de débito que precisa ser quitado aproximadamente”, contou a promotora em 2018.

Na esfera criminal, no ano de 2010, oito pessoas foram a júri popular, no Fórum Rui Barbosa, situado na capital baiana. Foram elas: o dono da fazenda; quatro filhos dele; e mais três funcionários.

Na sentença, os funcionários foram absolvidos. O dono da fazenda e os filhos foram condenados à prisão em 2010, com penas que variaram entre 9 e 10 anos, por armazenar material explosivo de forma ilegal e produzir fogos de artifícios sem segurança. Até o momento ninguém foi preso.

Os réus recorreram da decisão ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), que confirmaram a condenação, mas os réus ingressaram com outro recurso no STF.

Os condenados alegam que teria havido descumprimento de direito à defesa.

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