Após uma “parceria” entre o Brasil e o Reino Unido foi possível sequenciar 427 genomas completos do novo coronavírus (Covid-19), encontrados no território brasileiro. Destes, cerca de 102 foram detectados como cepas iniciais, o que significa dizer que, mais de 100 linhagens entraram no país, logo no começo da pandemia da doença. Porém, segundo a pesquisa, apenas três conseguiram se espalhar, apontando assim que, o isolamento social pode ter favorecido significativamente a redução da diversidade das cepas com maior circulação.

Segundo os pesquisadores, o fato de existir distintos “tipos” de genomas da Covid-19 em circulação não implica na possibilidade de reinfecção por pessoas que já foram infectadas por outra cepa do vírus, que sofre mudanças mas, em essência, mantém nas diferentes linhagens suas características principais.

No final de fevereiro deste ano, alguns autores do atual estudo (Ester Sabino, Jaqueline Goes e Nuno Faria) já haviam sequenciado, em tempo recorde, o genoma do Sars-Cov-2, que é responsável pelo primeiro caso detectado no Brasil. Por volta de pouco mais de três meses depois, o banco de dados foi ampliado. Com isso, foi possível traçar uma árvore mais específica da genética do vírus no país.

Conforme explicou Sabino, pesquisadora do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da USP, as três cepas (sequências genéticas diferentes do novo coronavírus) que conseguiram se espalhar pelo território brasileiro foram transmitidas antes da confirmação do primeiro caso. Com isso, segundo a pesquisadora, os dois primeiros casos sequenciados e confirmados em São Paulo não deram início à pandemia no país.

“Estes dois primeiros casos sequenciados não deram origem à pandemia no Brasil”, garante Ester Sabino.

“As três cepas que encontramos agora foram as que se espalharam mais, e provavelmente infectaram pessoas antes dos dois casos iniciais em São Paulo. O vírus já estava circulando uns 10 dias antes”, completou.

Já Nuno Faria, pesquisador da Universidade de Oxford, avaliou que, com base em dados de mobilidade municipal, estadual e nacional, eles conseguiram mostrar também que, além da redução da diversidade genética do vírus, a implementação das medidas de isolamento também diminuiu a taxa de transmissão. Por exemplo: um indivíduo poderia transmitir para cerca de 3 outras pessoas antes da quarentena; depois, com a redução do contato interpessoal, para apenas 1.

“Diminuíram o número de reprodução de 3 para perto de 1. As medidas contribuíram também para a velocidade de expansão do vírus, mas mesmo assim não conseguiram barrar totalmente. Claro, como em todo o mundo, mas isso atrasou a chegada do vírus em outros centros urbanos”, destacou Nuno Faria.

Ademais, outra conclusão apontada pelos pesquisadores, mostra que, as três cepas mais disseminadas no país chegaram por São Paulo e também pelo Ceará. Não é possível, com a base de dados disponível, determinar com precisão a origem exata de cada uma delas fora do Brasil.

Uma amostra retirada na Itália, de um paciente que estava em Milão, por exemplo, pode não ser de uma “linhagem italiana”, necessariamente. A pessoa pode ter viajado e retornado da Alemanha, salientam os cientistas, que dizem que seria útil ter acesso ao histórico de viagens para conseguir determinar com mais precisão as origens do vírus.

Outras informações

O levantamento dos pesquisadores ainda frisa que é possível dizer que as três cepas do vírus mais disseminadas no Brasil tiveram origem da Europa, bem como dos Estados Unidos (EUA).

“Diversidade genética está associada com a transmissão diretamente. Quanto maior o número de pessoas infectadas, e quanto mais explosiva, maior será a diversidade genética do vírus. São processos intrinsecamente relacionados. Assim, ainda precisamos de mais pesquisas, isso pode influenciar na criação de uma determinada vacina no Brasil”, revelou Nuno.

Porém, até o momento, os cientistas asseguram que ainda não é possível determinar com exatidão se uma das mutações encontradas nas sequências tem algum papel na disseminação do vírus. Entretanto, outros grupos de estudos estão em busca da resposta.

Além dos 427 genomas obtidos neste esforço internacional, os pesquisadores também consideraram outros 63 que já tinham sido sequenciados pela Fundação Oswaldo Cruz.

O artigo foi assinado por mais de 70 cientistas de algumas instituições, como: a Universidade de São Paulo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade de Campinas, Universidade de Oxford, Imperial College of London, entre outras. A pesquisa também conta com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de S. Paulo (Fapesp).

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