Entre um drible e outro nos puliça, o que não falta no baba da bandidagem é Gol. O carro da Volkswagen é o preferido dos ladrões de Salvador e Região Metropolitana (RMS), de acordo com os boletins diários disponibilizados pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) em seu site desde o dia 17 de janeiro.
Do total de roubos e furtos de carros registrados nos boletins (1.153 até as 18h de ontem), quase 17% (193) são Gols. Em segundo aparece o Corsa (123), seguido de perto do Uno (121). Completam o pódio o Palio e o Celta – veja lista na página ao lado.
Entre os que levaram uma tabaca dos ladrões está o flamenguista Raniere Oliveira, 45 anos. Ele perdeu seu Gol numa madrugada escura de junho, em uma rua do Parque Júlio César, na Pituba – bairro da capital onde mais se rouba carros, também segundo o boletim da SSP.
Como na Alameda Beneveto, onde mora, não havia vagas, ele teve que deixar o veículo em um local mais afastado. “Quando desci para trabalhar, no outro dia, o carro não estava onde deixei”, lembra. Por azar, Raniere tinha cancelado o seguro do carro havia seis meses.
O veículo, comprado por R$ 8 mil, havia acabado de passar por uma reforma completa na chaparia, que custou à vítima R$ 2.400. Raniere afirma que não comprará mais carros Gol.
Facilidade
Líder do ranking de roubos, o Gol foi o 2º carro mais vendido da Bahia em junho, atrás do Uno, de acordo com a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). A picape Strada, da Fiat, foi o terceiro modelo mais emplacado, o Celta ficou em quarto e o Siena em quinto.
Mas, como malandro que é malandro gosta de vida fácil, a paixão dos assaltantes pelo carro tem um motivo muito simples – a fechadura cede com mais facilidade que a dos demais veículos. O titular da Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos de Veículos (DRFRV), Augusto Eustáquio, foi procurado, mas não quis falar sobre o assunto. O CORREIO solicitou entrevista com o delegado-chefe, Hélio Jorge, mas não teve o pedido atendido.
Contudo, segundo informações da DRFRV, qualquer pessoa com conhecimentos elementares abre rapidamente a porta de um Gol, sem precisar arrombá-lo. A Volkswagem foi procurada, mas não comentou a informação.
Bairros
A Pituba, onde Raniere mora, é o bairro da capital onde mais carros são roubados, também de acordo com os boletins diários da SSP. Os outros três bairros mais perigosos são Itapuã, Imbuí e Brotas – veja tabela acima.
Segundo a polícia, o cenário na Pituba se deve ao fato de ser um bairro nobre e haver grande concentração de carros e por ser próximo ao Nordeste de Amaralina. Os demais bairros seguem a mesma lógica da quantidade de veículos. Na RMS, as cidades mais perigosas são Lauro de Freitas, Camaçari e Simões Filho.
Diferenças
No site da SSP são informados modelo, placa e local onde o roubo ocorreu, dados que foram usados como amostragem, mas na realidade o número total de roubos é bem mais alto. No mesmo site, balanços de ocorrências mensais da Coordenação de Documentação e Estatística Policial (Cedep) mostram que de janeiro a junho foram registrados 3.598 roubos e furtos de veículos em Salvador e RMS – média de 599 ao mês.
Segundo a SSP, a diferença ocorre porque os boletins diários são realizados com base nas ligações recebidas pelo 190, enquanto os balanços mensais são feitos somando as ocorrências de cada delegacia – como muitas vezes quem tem o carro roubado vai diretamente à delegacia, o registro não sai no boletim diário.
Um terceiro número, da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais (CNSeg), aponta que entre janeiro e junho foram roubados 5.008 veículos só em Salvador – isolada da RMS.
Finalidade
Segundo a DRFRV, a destinação dos veículos roubados varia muito. Carros como Gol, Corsa e Uno, que lideram o ranking, além de usados em ações criminosas rápidas, servem para desmanche.
Em Salvador, a polícia calcula que existem 30 oficinas de desmanche de carros. A DRFRV informou que para combater a prática é necessário trabalho em conjunto com a Secretaria da Fazenda.
Bahia é o 5º pior estado em recuperação de carros
A Bahia é o quinto pior estado em recuperação de carros roubados e furtados em 2011, segundo a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais (CNSeg). A organização registra dados diferentes dos divulgados pela polícia baiana. Enquanto a SSP contabiliza este ano 2.886 roubos e furtos em Salvador (isolada da Região Metropolitana) a CNSeg aponta que houve 5.008 veículos roubados no mesmo período. Desses, apenas 37% (1.882) foram devolvidos aos donos.
O dado de recuperação, aliás, é mais próximo ao da SSP, que registra 1.820 veículos recuperados. De acordo com as estatísticas da CNSeg, a Bahia está à frente apenas de Roraima, que recuperou 28%, Sergipe (30%), Maranhão (31%) e Pará (37%). A Bahia tem maior frota entre os cinco – com 2.308.978 carros. A menor é a do lanterna Roraima, com 125.451 veículos.
Os que mais recuperaram carros foram Amazonas, com 70% de carros devolvidos aos donos, Distrito Federal (67%) e Santa Catarina (64%). Entre os primeiros em recuperação, a maior frota é a de Santa Catarina, com 3.414.195 veículos. Depois estão Distrito Federal (1.245.521) e Amazonas (530.814).
Uso de cada veículo
CARROS PEQUENOS Usados em assaltos como apoio aos ladrões que executam o crime nas motocicletas. Na guerra entre quadrilhas rivais, servem para transportar os bondes que vão matar inimigos.
PICAPES E VANS Servem para assaltos com grande quantidade de carga, como roubos a residências e comércios. Também usados em assaltos a bancos.
MOTOS Mais ágeis, servem para fuga em assaltos rápidos, como saidinhas bancárias e a casas lotéricas, por exemplo. Também usadas por bandidos para se locomover em ruas estreitas.
Roubos de carros aumentam
De acordo com dados divulgados pela Coordenação de Documentação e Estatística Policial (Cedep), houve de janeiro até junho deste ano 3.598 roubos e furtos de veículos, em Salvador e Região Metropolitana – uma média de 599 ao mês.
Segundo os dados do Cedep, os furtos e roubos cresceram levemente se comparados com o mesmo período do ano passado, quando os ladrões levaram 3.455 carros na cidade – um aumento de 4,14%. Por outro lado, a quantidade de veículos recuperados também cresceu um pouco – 5,45% -, entre janeiro e junho.
Enquanto em 2011 foram devolvidos aos donos 1.820 carros, ano passado o número foi de 1.726, no mesmo período. De acordo com esses números, a polícia recupera cerca da metade dos carros roubados na cidade: 49,96% em 2010 e 50,58% este ano.
Motos: 2,8% recuperadas
Do total de veículos roubados em Salvador e Região Metropolitana, 22% são motocicletas, de acordo com o boletim diário da Secretaria da Segurança Pública (SSP). São 253 registros de roubos e furtos de motos desde 17 de janeiro – quase todas de 125 ou 150 cilindradas – sendo que apenas sete (2,8%) foram recuperadas, um índice bem mais baixo que o de carros.
Os bairros mais perigosos para os motociclistas são diferentes daqueles arriscados para os motoristas de carro. Em Salvador, Pernambués e Pirajá, com sete casos cada um, lideram o ranking de roubos de moto. Em segundo lugar está o Retiro, com seis, seguido do Cabula e Periperi, com cinco. Na Pituba, campeã soteropolitana dos roubos de carros, houve apenas um registro de roubo de moto.
Na Região Metropolitana, o campeão de furtos e roubos é Camaçari – 24 ocorrências – seguido de Simões Filho (18) e Lauro de Freiras (11).
Fontes da polícia explicaram que a quantidade de motocicletas em bairros e cidades pobres é maior, por isso a diferença. A maior quantidade de motocicletas de baixa cilindrada na rua nessas localidades explica os roubos mais recorrentes. Além disso, por serem pequenos, esses veículos são mais fáceis de esconder e difíceis de identificar.
A polícia informou ainda que muitas motocicletas recebem placas frias e são usadas pelos criminosos para fazer saidinhas bancárias e assaltos rápidos a lotéricas da cidade, por exemplo, além de serem úteis para se locomover pelas ruas mais estreitas das favelas e fazerem aviãozinho de drogas. Outro motivo apontado é o crescimento do mercado de peças, principalmente com o aumento do número de mototaxistas nas ruas.
O presidente da Associação de Motociclistas do Estado da Bahia, Ruiter Franco, concorda. “A frota cresceu, o mercado paralelo de peças também. Isso aumentou a violência aos motociclistas”, afirmou. Além do mercado de peças, muitas motos roubadas na capital são ilegalmente emplacadas e vendidas a baixo preço na zona rural. “As motos baratas ficam mais baratas ainda. Quem viaja pelo interior vê que muitos agricultores deixaram os cavalos de lado”, observa Franco.
Matéria produzida pelo *Correio da Bahia