Quinta-feira, 20 de junho. Manifestantes enfrentam a Polícia Militar na Avenida Joana Angélica, Barris e Campo Grande, durante os protestos que tomaram ruas de todo o Brasil. Dia histórico que, como tal, ignora a rotina.
Só que a rotina também ignora o movimento. E, às 12h daquele 20 de junho, um duplo homicídio ocorrido em Dias D`Ávila – de um menor de 13 anos e uma mulher com identidade ignorada – entrou na conta como os 1.000º e 1.001º assassinatos em Salvador e Região Metropolitana (RMS) este ano.
Os números, calculados pelo CORREIO com base em boletins diários divulgados pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) em seu site, revelam uma taxa de 59,78 homicídios por 100 mil habitantes na capital e RMS.
Este é o terceiro ano consecutivo que o CORREIO faz os cálculos baseado nas 1.000 primeiras mortes em Salvador e RMS. A análise deste ano mostra que as ações da Secretaria da Segurança Pública reduziram a violência com relação a 2012, quando, sob influência da greve da PM, as mil mortes foram atingidas em 18 de maio (taxa de 74,55 homicídios por 100 mil habitantes). No entanto, ainda não se conseguiu retornar aos patamares – já altos – de 2011, ano em que a milésima morte aconteceu em 26 de junho – uma semana depois deste ano.
Comparando-se os dois últimos anos sem greve de PM (2011 e 2013), o aumento da violência está concentrado na RMS, onde, considerando os períodos de mil assassinatos, se observa um aumento de 14% na taxa de homicídios – 65,82 homicídios por 100 mil habitantes em 2011 para 75,32 em 2013. Já na capital houve redução de 4,9% – 57,37 homicídios/100 mil habitantes em 2011 para 54,57 este ano.
Entre os 12 municípios que compõem a RMS, somente dois (Dias D’Ávila e Itaparica) reduziram o número de homicídios, no universo das mil primeiras mortes de 2011 e 2013.
Nos outros dez, houve aumento. Mata de São João, por exemplo, pulou de dez assassinatos em seis meses de 2011 para 21 no mesmo período de 2013, atingindo uma taxa de 111,55 homicídios por 100 mil habitantes, quase a mesma de Simões Filho (112,11), que é historicamente o município mais violento do país.
No caso de Mata de São João, o aumento é observado inclusive com relação a 2012, ano da greve, quando o município registrou 14 assassinatos entre os mil primeiros do ano.
Salvador
Na capital, o ranking de homicídios este ano é encabeçado por São Cristóvão (28 homicídios no universo dos mil primeiros), seguido de Paripe e Cajazeiras (27), Periperi (25) e Lobato (17). Os cinco já estavam entre os dez mais violentos em 2011. São Cristóvão ficou entre os cinco primeiros nos três anos: 4ª em 2011 (22 homicídios), 2º em 2012 (também 22 homicídios) e 1º agora.
Há, porém, também destaques positivos. É o caso de São Marcos, que diminuiu de 19 homicídios (5ª posição em 2011) para 7 em 2012 e 4 este ano. Já a Boca do Rio saiu de 15 em 2011 para 19 em 2012 e caiu para 6 homicídios este ano.
Com relação às idades das vítimas, observa-se que a maioria é de jovens. Entre as idades com mais mortes estão: 20 anos (44 vítimas), 21 (43), 19 (42) e 22 (41). Ou seja, 23% das vítimas com idades identificadas (717) têm entre 19 e 22 anos.
Outro lado
O CORREIO solicitou à SSP uma entrevista com o titular da pasta, Maurício Barbosa. A assessoria do órgão informou que o secretário não falaria porque estava viajando. Conforme sugestão da própria assessoria, a reportagem enviou seis perguntas.
Entre elas, estavam questões sobre os motivos para o estado não ter atingido os índices de 2011 – ano anterior à greve da PM -, os motivos da crescente violência em São Cristóvão, bairro com maior número de homicídios, e em Cajazeiras, onde se observa um aumento nos últimos anos (17, 25 e 27 homicídios, em 2011, 2012 e 2013, respectivamente).
Também foi pedida uma posição sobre Mata de São João, cidade que, em números proporcionais, possui taxa de 111 homicídios/100 mil habitantes, abaixo somente de Simões Filho.
A SSP atendeu à solicitação com uma nota oficial em que registra que na comparação com o ano passado, em que houve a greve da PM, foi registrada uma queda nos índices de Crimes Violentos Letais Intencionais (que registram não somente o homicídio, mas também o latrocínio e a lesão corporal seguido de morte), de 14% em Salvador, e de 26,3% na Região Metropolitana. Os períodos considerados foram de janeiro a maio.
Na nota, a SSP credita a melhora nos índices ao “empenho do trabalho policial”, já que foi registrado também um “aumento dos inquéritos remetidos com autoria em Salvador e RMS. De 3.435, no período de janeiro a maio de 2012, para 3.694 no mesmo período de 2013. Já a apreensão de armas saiu de 410 em 2012 para 442 este ano, também no referido período”, informa o documento.
Sobre o aumento de homicídios em Mata de São João, a nota da SSP apenas afirma que há um trabalho para a redução dos índices de violência.
É citada também a prisão de seis membros de uma quadrilha de traficantes que atuava no Subúrbio Ferroviário de Salvador que foi, de acordo com a polícia, responsável pela chacina de cinco pessoas, em março deste ano.
As vítimas atuavam no comércio de drogas em Mata de São João.
Por telefone, a assessoria da SSP informou que não respondeu aos questionamentos do CORREIO por desconsiderar a comparação entre 2011 e 2013.
Além disso, a assessoria da SSP não comenta os dados utilizados pelo CORREIO por não considerá-los oficiais, embora todos estejam publicados no site do órgão. A argumentação é de que essas informações são preliminares e passíveis de correção.
No site, as estatísticas que a SSP considera oficiais estão desatualizadas e contabilizam os crimes somente até o mês de março. Os dados da SSP contabilizam 601 homicídios entre janeiro a março em Salvador e RMS, 3% a mais que os que aparecem nos boletins de homicídios que são publicados diariamente na mesma página.
Por não reconhecer os dados, nenhuma outra autoridade da SSP, entre delegados e comandantes de companhias da Polícia Militar, foi autorizada a falar.