Na manhã desta segunda-feira (23), durante a primeira edição do programa Bahia No Ar (Rádio Sucesso 93.1), o repórter Clerisson AMorim conversou com o juiz do trabalho, Rodolfo Mário Veiga Pamplona Filho, que é titular 32ª Vara do Trabalho de Salvador. Na pauta, a flexibilização das normas trabalhistas, diante desse cenário de crise provocada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19).

Segundo analisou Rodolfo, a flexibilização “do ponto de vista técnico, há realmente muita resistência à flexibilização, porque sabemos que o regime de trabalho é concebido para proteção do trabalhador, e toda flexibilização retira essa proteção. Mas, a ideia é que se faça uma flexibilização pensando nessa situação peculiar do coronavírus. Nós estamos vivendo algo absolutamente inédito. Então, se houver a garantia que isso for realmente temporário, e só, e somento só, para combater os efeitos de uma crise que nunca vimos na história do mundo, pode ser sim um caminho”.

Questionado sobre as sanções, no caso de atraso no pagamento dos salários, que possivelmente serão uma realidade, o juíz destacou:

“Não temos a menor dúvida que o empregador vai sofrer grandes dificuldades. Toda atividade econômica nas próximas semanas, diria mais, nos próximos meses, vai sofrer grandes perturbações, porque a falta de dinheiro no mercado, a própria impossibilidade de produção vai gerar grandes preocupações e poderá afetar os salários dos empregados. Do ponto de vista técnico, a relação do emprego tem no salário uma característica de forfetariedade, ou seja, que o salário é devido independentemente da condição econômica do empregador. Então, neste caso, se não houver nenhuma mudança das regras do jogo como já provisória, por meio de lei ou qualquer que seja, o fato é que, se o empregador atrasar o salário do empregado que esteve disponível para trabalhar, aí sim, realmente, pode gerar uma despedida indireta ou as sanções correspondentes. É claro que isso vai ser algo muito bem analisado, cada caso concreto, até mesmo pela peculiriadade existente”, pontuou.

Já no caso das férias, o magistrado fez a seguinte observação: “essa é uma matéria que já se anuncia a edição de uma Medida Provisória [MP], ou de algum tipo de mudança normativa para tentar adotar a um período de flexibilização. Nas regras hoje vigentes, para conceder férias coletiva, precisaria haver uma antecedência de quinze dias da ciência, e para as férias individuais de trinta dias. O fato, porém, é que não há uma sanção pecuniária reversível ao empregado por esse descumprimento, e talvez, a situação do coronavírus justifique uma aplicação do artigo oitavo da CLT, na ideia de que ‘nenhum interesse individual pode se sobrepor a um interesse coletivo’, pode ser um caminho”.

Redução da Jornada de Trabalho

Para Pamplona Filho, “há várias alternativas que podem ser estudadas”. Ele enumera algumas delas: “a primeira é efetivamente a ideia de redução, mas redução da jornada de trabalho com a redução correspondente de salário é algo que, hoje, no sistema até então vigente, só é possível por norma coletiva. Nada impede que alguém contrate outra pessoas em jornada em tempo parcial, mas os atuais empregados, pra ter uma redução, é preciso que seja por norma coletiva. Pode ser que venha a Medida Provisória flexibilizando, de constitucionalidade duvidosa, mas no campo da jornada de trabalho há outras questões que podem ser utilizadas, não pensando em redução de salário, mas sim, por exemplo, a questão de compensação de jornadas, do banco de horas, que depois da Reforma Trabalhista pode ser até por seis meses. Então, poderia dispensar o trabalhador nesse momento, compensando essas horas posteriormente, talvez como uma forma de gerenciar essa crise”.

Teletrabalho (trabalho remoto, trabalho a distância)

“É uma matéria que pode ser muito bem negociada. Se o empregador tem condições que aquela atividade do empregado seja prestada de forma distante, a distância, pelo home office, pelo teletrabalho, e o empregado tem as condições técnicas de assim proceder, sem sombra de dúvidas isso pode ser algo extremamente recomendável, até pela necessidade do isolamento social”, elucida.

Por fim, Rodolfo acrescenta que esse tipo de alternativa temporária pode ser bastante positiva.

“Há, sem sobra de dúvidas, um grande ganho do ponto de vista social, porque o trabalho continua sendo prestado, a remuneração pode continuar sendo paga, sem nenhuma  discussão. Então, a orientação para o empregador é estimular, verificar se há condições, e nesse ponto , sempre advertir o empregado aos eventuais riscos à sua saúde. E [por parte] do empregado, se ele tem condições técnicas de fazer isso, acho que vale a pena sem sombra de dúvidas aceitar e, muitas vezes, até propor [alternativas] para tentar pensar em uma solução que resolva esse grave problema que estamos vivendo”.

0 0 votos
Article Rating