Virou um jogo de empurra a responsabilidade do prejuízo aos cofres públicos deR$ 448 milhões decorrentes de erros de cálculo de precatórios em sentenças judiciais na Bahia. O tamanho do rombo foi divulgado na terça-feira, 16, em relatório preliminar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que aponta irregularidades no Tribunal de Justiça (TJ-BA). O CNJ abriu sindicância contra o presidente do Tribunal, Mário Alberto Simões Hirs, e sua antecessora, Telma Laura Silva Britto.

Ontem, Telma e Hirs convocaram a imprensa para uma entrevista coletiva para se defender. A ex-presidente reconheceu que pode haver erros nos cálculos realizados pelos juízes de primeira instância que determinaram os pagamentos dos precatórios, mas reclamou do CNJ por não divulgar como chegou a valores tão inferiores. “Pode haver algum erro de cálculo, se tratar de algum ajuste monetário, mas isso precisa ficar claro como o CNJ chegou a este valor”, disse.

O desembargador Mário Hirs lembrou da responsabilidade do governo do estado e da prefeitura de Salvador. Ele diz que, apesar do cargo que ocupa, não pode alterar as decisões judiciais. “Antes do trânsito em julgado, houve expressa concordância do procurador jurídico da entidade devedora (Estado e Município) com o valor apresentado pela empresa credora”.

Outro Lado

Essa não é a versão da Procuradoria-Geral do Estado (PGE). As quatro ações contra o governo que geraram precatórios foram de atrasos em pagamentos para prestadores de serviço do Departamento de Infraestrutura de Transportes da Bahia (Derba).

Segundo a procuradora-adjunta Joselita Cardoso Leão, houve recurso em dois casos, mas o TJ teria optado por não acatar os questionamentos. Segundo a procuradora, há em andamento na PGE outra ação citada pelo CNJ.

“Em relação aos precatórios emitidos contra o Estado da Bahia, sempre que identificadas incorreções ou excesso, a PGE, invariavelmente, apresenta impugnação”, disse. O rombo para o Estado é de R$ 216 milhões.

A prefeitura, por meio de nota, informou que a Procuradoria-Geral do Município (PGM) irá analisar os quatro casos em que houve erro no cálculo, gerando prejuízo aos cofres municipais e, caso ateste irregularidade, irá “tomar as medidas judiciais cabíveis”. O rombo para o município é de R$ 231 milhões.

Precatórios

Precatórios são dívidas do poder público com pessoas físicas ou empresas privadas decorrentes de uma condenação judicial. Nesses casos, em vez da cobrança acontecer por penhora de bens de entes públicos, ela se dá pela expedição de uma ordem de pagamento, para a inclusão da dívida no orçamento público e pagamento em outro exercício.

Dos R$ 448 milhões a mais calculados em sete condenações contra Prefeitura e Estado, apenas R$ 19 milhões já foram pagos, de acordo com o presidente do TJ.

Contrato sem licitação

Crítica do CNJ

A Corregedoria do CNJ mandou fazer licitação para escolher o banco para administrar depósitos judiciais. O TJ-BA ignorou e continua com contrato, com dispensa de licitação, com o Banco do Brasil.

Resposta do TJ-BA

O contrato com o Banco do Brasil foi firmado em 2010 com validade de 5 anos. “Foi firmado esse contrato com o Banco do Brasil, e teremos que pagar uma multa se encerrarmos o contrato. O CNJ quer que a gente pague multa de um contrato que ainda está em vigor?”, questiona o presidente do TJ.

Declação de bens

Crítica do CNJ

Quase 1.500 servidores e magistrados (14% do total) não apresentaram as declarações de renda e bens, contrariando orientação do CNJ. No relatório, o corregedor diz que não houve “qualquer medida efetiva de cobrança da parte da presidência do Tribunal”. A lei de improbidade administrativa condiciona o exercício e a posse de agente público à declaração de renda.

Resposta do TJ-BA

O prazo para declaração é até o dia 15 de maio deste ano e que, para o cumprimento desse prazo, já houve publicação de quatro decretos judiciais, além da abertura de um sistema interno que facilita o repasse das informações requisitadas aos servidores por eles.

Lauro de Freitas

Crítica do CNJ

Segundo a Corregedoria, a Vara Criminal da Comarca de Lauro de Freitas está sem juiz titular “por prazo além do razoável”, contando apenas com um juiz, que é titular da Vara de Castro Alves e comparece uma ou duas vezes por semana na cidade.

Resposta do TJ-BA

O Tribunal alega que faltam magistrados por questões financeiras. A nomeação de 99 magistrados é apontada como uma solução, mas não tem data definida.

Concurso

Crítica do CNJ

A Corregedoria reclama de falta de interesse do TJ em agilizar a seleção dos titulares dos cartórios extrajudiciais, e determinou a realização de concurso até 8 de julho.

Resposta do TJ-BA

O Tribunal argumenta que uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que questiona a legalidade da lei que privatizou os cartórios implicou no desinteresse de empresas a realizarem o concurso, com temor de paralisação por meio de liminares, e a decorrente suspensão no pagamento do serviço. A única que aceitou fazer parte do processo, a Cespe, voltou atrás no segundo semestre do ano passado. O TJ diz que tem consultado outras empresas e procurado uma forma de realizar o concurso que vai determinar as condições técnicas e financeiras para os delegatórios. Não foi dado prazo para a realização desse concurso.

Informações

Crítica do CNJ

O CNJ diz que houve uma desatenção do Tribunal em relação aos pedidos de informações e documentos que subsidiariam o trabalho da Corregedoria.

Resposta do TJ-BA

O TJ diz que foram enviados 99 emails a uma servidora do CNJ responsável pela coleta das informações e que, além disso, quatro cópias dos documentos foram enviadas em um CD.

Falta de mutirões

Crítica do CNJ

A abertura da sindicância contra os ex-presidentes fala de ‘atrasos significativos’ e ‘descontrole nos serviços’. Documento do CNJ cita processo que tramita há 23 anos. Além disso, determina, em 2012, a realização de mutirões para resolver ‘milhares de processos em atraso por muitos anos’.

Resposta do TJ-BA

O TJ diz que houve determinações de mutirões por parte dos presidente das câmaras, inclusive com mutirões aos sábados, fato que foi comunicado ao CNJ. Os mutirões nas varas de 1º grau ocorreram, segundo o TJ, em comarcas com maior acúmulo de processos, a exemplo das comarcas de Serrinha, Dias D’Ávila e as 29ª e 30ª Varas Cíveis da capital. “Fizemos os mutirões mesmo diante da atual carência de 275 magistrados em todo o estado, o que deve ser minimizado com a nomeação de 99 juízes”.

Funcionários fantasmas

Crítica do CNJ

A correição constatou que servidores de gabinetes de desembargadores (sete foram analisados) trabalham apenas um ou dois dias por semana. Em um dos casos citados pelo CNJ, a filha da desembargadora Daisy Lago Coelho, Sanda Lago Coelho Izzo, seria funcionária do desembargador Clésio Rômulo Carrilho Rosa. Sandra, segundo o relatório, reside em São Paulo e não era conhecida de nenhum dos funcionários do desembargador.

Resposta do TJ-BA

Segundo o presidente do TJ, o estabelecimento dos expedientes é feito de acordo com um regimento interno que atribui a cada desembargador a fixação dos horários do seus funcionários. “O CNJ visitou os gabinetes e apontou apenas dois casos. Estamos falando de algo pontual, não de que os servidores não têm expediente. Esses dois casos estão sendo apurados e tomaremos medidas se comprovados”, diz. Fonte: Correio