“Tava ruim lá na Bahia, profissão de boia-fria/ Trabalhando noite e dia, num era isso que eu queria/ Eu vim me embora pra ‘Sum Paulo'”. Jumento Celestino deu início ao primeiro e único show banda Mamonas Assassinas em Salvador.
A lembrança é do comunicólogo Marcos Loureiro, 40, que na época foi ao show com dois amigos, mas para ver o Gera Samba. “Nós combinamos de ir ao show para ver o Gera Samba, que estava no auge com Carla Perez e Débora Brasil. A gente estava mais distante do palco, mas quando Dinho entrou correndo passando pela bateria, balançando os braços e as pernas, subindo na caixa de som e dizendo ‘Eu sou da Bahia, porra, minha terra’, não tive como não chegar mais perto”, conta. Vale ressaltar que o vocalista do Mamonas era baiano, natural de Irecê.
Já o engenheiro Dimitri Alcântara, 35, que também estava no show afirma que a música que de abertura foi Cabeça de Bagre. “Eles começaram com aquela que diz ‘Quando eu repeti a 5ª série/ tirava E, D, de vez em quando um C’. Lembro claramente, era uma música que eu gostava bastante e estava arranhando no violão”, comentou, ao lembrar que ele chegava do colégio ligava o rádio para poder gravar na fita cassete as músicas dos Mamonas. “Eu chegava a ligar para a rádio pedindo para tocar”.
Com 15 anos e na 8ª série naquela época, Dimitri conta ganhou o ingresso do pai por ter passado de ano. “Fui com um colega de colégio e a gente se divertiu muito. Já tinha o disco da banda e sabia cantar todas as músicas do show. Musicalmente falando, eles eram muito bons. As músicas traziam um leque de estilos musicais extremamente amplo, que ia da música tradicional portuguesa até o heavy metal. Todos eles eram músicos extremamente habilidosos também”, opina.
Vinte anos atrás, a internet ainda estava começando a crescer, não havia smartphones, nem câmeras digitais. Por consequência desses fatos, não há muitos registros e informações sobre a festa, o setlist do show não pôde ser reconstruído a não ser com base na memória dos fãs presentes.
Por isso, Loureiro jura que a segunda música da noite foi Vira-vira, seguida de todos os outros sucessos da banda. Dentre as mais esperadas, Pelados em Santos. “Era a música mais especial”, resume Dimitri Alcântara. No Carnaval de 1996, os Mamonas eram cantados em todos os trios elétricos de Salvador.
Para muitos, o dia 23 de dezembro de 1995 ficará na história, a data que caiu num sábado marcava o show dos Mamonas Assassinas, que teve também apresentações do cantor Ricardo Chaves e do grupo Gera Samba, futuro É O Tchan, que foi a última atração do evento.
Com um público predominantemente jovem, a multidão se apertava para ver o grupo, formado por Júlio Rasec, Dinho, Bento Hinoto e pelos irmãos Sérgio e Samuel Reoli. O show aconteceu menos de três meses antes do acidente aéreo que matou os cinco músicos, no dia 2 de março de 1996, que hoje completa 20 anos.
Estourados
Para Marcos Loureiro, apesar de o grupo ser presença constante em programas de TV na época, foi somente no dia do show que ele atentou para o trabalho dos Mamonas. “Eu estagiava no Banco do Brasil, ali nas Mercês, e na segunda-feira depois do show, combinei com esses meus amigos, que também trabalhavam lá, de ir a uma loja de discos no Shopping Piedade para comprar o CD dos caras. Quando a gente chegou, tinha esgotado. Tivemos que esperar uma semana para comprar”, lembra.”Eu vi um show dos caras e para apagar isso da memória é difícil”, completa.
O sucesso meteórico da banda entre os anos de 1995 e 1996 pode ser medido pelo número de vendas do seu único álbum – 3 milhões de cópias -, mas também pela agenda lotada de shows, eventos de divulgação e gravação de programas de rádio e TV. Entre meados de agosto de 1995 e março de 1996, os Mamonas estiveram presentes em quase 150 eventos.
O fotógrafo Edson Ruiz, responsável por boa parte das fotos matéria, afirma que foi convocado para a cobertura do show com duas missões: registrar os fogos de artifício disparados pela banda em cima do palco e ter atenção para o público, já que a banda iria atrair muitas crianças. “Eu trabalhei no CORREIO por dois anos e uma coisa que eu me lembro bem foi exatamente essa orientação. Chegaram a dizer para eu tomar cuidado com os Mamonas ‘tudo pode acontecer, eles são meio malucos’, me disseram”, recorda.
O fotógrafo também lembra da leveza com que a banda levava o seu show. “O show me surpreendeu muito, não era nada do que a gente estava acostumado a cobrir. Eles brincavam mesmo no palco e eu ri demais naquele dia. Os caras tinham uma energia fantástica. Acho que isso está ligado a uma genialidade, que é o que vejo hoje em Neymar, no sentido de que ele entra em campo pra jogar, sim, mas também para brincar com a bola”, compara.
Mesmo tendo fotografado Carla Perez descendo na boquinha da garrafa, o fotógrafo não se lembra de outras atrações do evento, além dos Mamonas. “O show de Gera Samba e Ricardo Chaves eu não lembro, nem sabia que eles tinham se apresentado no dia”, admite sem culpa.
Relíquia
Nesses vinte anos sem os Mamonas, qualquer elemento que remeta ao grupo se transforma em relíquia. Tanto assim, que ingressos, CDs, camisetas, pôsteres, revistas e até álbum de figurinhas podem ser encontrados à venda na internet. Os preços variam de R$ 1,50, por cada figurinha do álbum, a R$ 700, pelo CD autografado pela banda após o último show em Brasília.
Mesmo após vinte anos da morte de todos os integrantes da banda, o grupo Mamonas Assassinas continua a ser ouvido, cantado e lembrado por uma quantidade de pessoas bastante significativa. Em um levantamento inédito divulgado esta semana, o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) mostrou quais as músicas do grupo mais tocadas e também mais regravadas por outros artistas.
Desde 2004 até 2015, as músicas mais tocadas dos Mamonas Assassinas em festas, shows ao vivo e rádios foram Pelados em Santos, Robocop Gay e Vira-vira. Também segundo o Ecad, entre as canções mais regravadas por outros artistas estão no Top 5, respectivamente, Pelados em Santos, Robocop Gay, Chopis centis, Vira-vira e Sábado de Sol.
Em 2011, o documentário Mamonas Para Sempre, dirigido por Cláudio Kahns, chegou aos cinemas. A ideia é que o trabalho resultasse em um longa de ficção – que seria estrelado por Rodrigo Faro, e segue na gaveta -, mas a pesquisa rendeu tanto que o diretor decidiu reunir os depoimentos de pessoas ligadas ao grupo, produtores, jornalistas e familiares que durante os sete meses de carreira acompanharam a banda.
Este ano, o grupo receberá uma homenagem no teatro. Com previsão de estreia p para o próximo dia 11, em São Paulo, o Musical Mamonas percorrerá várias cidades, incluindo salvador, programada para osegundo semestre. Com direção de José Possi Neto e texto de Walter Daguerre, o espetáculo conta, no elenco, com Ruy Brissac, Arthur Ienzura, Elcio Bonazzi, Yudi Tamashiro e Adriano Tunes. O espetáculo não contará apenas com composições do grupo. Também fazem parte do repertório músicas de bandas como Titãs, Legião Urbana, Engenheiros do Hawaii, Guns N´Roses e Rush.
As informações são do Correio