A segunda queda consecutiva na receita nominal do varejo em julho evidencia que o consumo das famílias diminuiu, afirmou Juliana Vasconcellos, gerente da Coordenação de Serviços e Comércio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nesta quinta-feira, 11. Naquele mês, o recuo da receita nominal foi de 0,7%, enquanto em junho já havia tido queda de 0,1% em relação a maio.
"Antes mesmo de descontar o efeito da inflação, a receita está caindo. Isso mostra que o consumo das famílias realmente diminuiu", afirmou a gerente. Na comparação com julho de 2013, contudo, a receita nominal ainda mostrou expansão de 5,9%, segundo o IBGE.
A redução no consumo das famílias é reflexo da menor expansão no crédito, do maior endividamento e da conjuntura econômica menos favorável, avaliou Juliana. "Em geral, estamos vendo uma economia menos favorável. Tudo indica para a diminuição do ritmo de expansão do crédito, de 9,2% (em julho do ano passado) para 5,0% em julho de 2014 em termos de acesso a recursos livres", disse Juliana.
"Além disso, o mês de julho de 2014 ainda teve Copa do Mundo. Por isso, houve redução de número de dias úteis", acrescentou. Segundo a gerente do instituto, a redução de dias úteis afetou principalmente a venda de móveis e eletrodomésticos e de hiper e supermercados (que fechavam as portas na hora dos jogos).
Principalmente no caso de bens duráveis, o comprometimento da renda e a satisfação já realizada pela compra do bem em períodos anteriores, diante dos estímulos do governo, influenciam o ritmo menor de vendas. "Esses setores estão em baixa, enquanto setores que são de bens essenciais, como farmacêutico, ainda estão em alta", disse Juliana.
Ainda em julho, o efeito contrário da Copa foi sentido pelo segmento de papelaria, com alta de 2,1% nas vendas em relação a junho. "Como houve antecipação das férias escolares por causa dos jogos, também houve antecipação da volta às aulas. Acreditamos que isso tenha influenciado", explicou a gerente.
Incentivos
A redução do número de dias úteis em julho, em função da Copa do Mundo, atrapalhou o desempenho das vendas de móveis e eletrodomésticos, mas não foi o único fator. A perda de força de políticas de incentivo ao consumo também contribui para o menor dinamismo do comércio desses bens, avaliou Juliana.
Em julho, móveis e eletrodomésticos tiveram recuo de 4,1% nas vendas contra junho, e uma queda de 9,2% na comparação com julho do ano passado. Na base anual, além do nível menor de vendas, o resultado acaba sendo deprimido por uma base muito alta, já que nesse período de 2013 ocorreu o auge do impacto do Minha Casa Melhor, programa que financia até R$ 5 mil em compras de móveis, eletrodomésticos e eletroeletrônicos para famílias do Minha Casa, Minha Vida.
"A base alta ajudou nessa queda mais intensa. Mas também houve acomodação das famílias em relação àquele incentivo. E agora, em 2014, com economia menos favorável, o consumo também reduziu", explicou Juliana.
Segundo a gerente do IBGE, o esgotamento das políticas de incentivo ocorre uma vez que esses bens duráveis não precisam ser trocados "todo ano". Além disso, a conjuntura desfavorável – diante do crescimento menor da renda, do maior endividamento das famílias, da menor expansão do crédito, da baixa geração de vagas e do desaquecimento da economia – acaba interferindo na decisão de consumo.
"Móveis e eletrodomésticos, assim como veículos, já vinham com incentivo do governo ao consumo. Mas agora as famílias já comprometeram sua renda e não têm tanta necessidade em renovar esses bens", disse Juliana.*Estadão.