A marcha na ponta dos pés não faz parte dos critérios diagnósticos do autismo, mas, frequentemente, encontramos crianças que, após aquisição da marcha, começam a andar na ponta dos pés, sem colocar o calcanhar no chão, de forma aleatória – apresentando-se esta, inclusive, em muitos casos, como uma estereotipia.

As pessoas com Transtorno do Espectro Autista, TEA, apresentam alterações de processamento sensorial em uma ou mais portas de entrada sensorial, o que pode influenciar diretamente a forma como ela anda.

A marcha na ponta dos pés no autismo pode assim estar associada a uma hipersensibilidade tátil (a criança considera a pressão na parte inferir dos pés desagradável e tenta evitá-la) ou a uma hipossensibilidade (quando descarrega o peso do corpo na ponta dos pés para explorar melhor o ambiente em busca de obter sensações que parecem lhe faltar). Pode ainda estar relacionada a um comprometimento do sistema vestibular, quando há alterações no sentido de equilíbrio e orientação espacial da criança, que pode tentar “compensar” andando na ponta dos pés; ou ainda, ser uma questão de processamento visual (que dificulta a correta percepção do ambiente, o que pode também alterar a marcha), entre outras possibilidades.

Vale lembrar que qualquer pessoa com TEA pode apresentar outras comorbidades associadas. E algumas condições podem cursar com hipertonia que, neste caso, se apresentaria como um aumento do tônus da musculatura do tríceps sural (da panturrilha), o que dificulta que a criança faça a dorso flexão dos pés e consiga colocar a planta do pé inteira no chão e, então, deambular de maneira habitual.

“Frente a uma criança que apresenta marcha na ponta dos pés, precisamos detalhar bem a história clínica, fazer um exame físico bem minucioso, para avaliar se existe alguma questão muscular envolvida, se é somente uma questão sensorial etc., e então traçarmos um plano de tratamento”, informa a neuropediatra Dra. Deborah Kerches,  especialista em Transtorno do Espectro Autista e Saúde Mental Infantojuvenil

A marcha na ponta dos pés merece atenção pois pode comprometer as atividades diárias da criança e/ou gerar dor e fadiga nas articulações, podendo ainda afetar a postura, a movimentação global e a forma como a criança conseguirá explorar o ambiente e receber seus estímulos.

Segundo a Dra. Déborah Kerches, cada caso deve ser avaliado com suas particularidades para que o médico especialista possa propor a melhor linha de tratamento. Podem ser utilizadas, por exemplo, intervenções sensoriais, atividades psicomotoras, fisioterapia etc. Em casos de hipertonia (tônus aumentado), em que mesmo com fisioterapia motora e medicações não se consegue diminuir a espasticidade, pode ser indicado bloqueio muscular com toxina botulínica tipo A e até cirurgia.

*Contribuiu para esta matéria a Dra. Deborah Kerches, neuropediatra, especialista em Transtorno do Espectro Autista e Saúde Mental Infantojuvenil.

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